quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Relíquia

Essa belíssima relíquia, que vocês veem abaixo, fica no meu criado-mudo.

Ela retrata um domingo, provavelmente no ano de 1980. Eu tinha uns 4 anos e estava visitando meus avós paternos.

À esquerda, minha bisavó. Ela não falava português mas assistia todo domingo ao Sílvio Santos. E tinha o costume de se exercitar: andava rápido, dando voltas ao redor da casa, elevando os braços alternadamente, dando tapinhas nas costas, com o punho fechado, para ativar a circulação (imagino eu). Eu não entedia muito bem o que ela fazia. Eu ficava sentada no sofá da sala de TV, olhando ela passar por mim uma, duas, três vezes...

Sentada, de vestido, minha obatian. Ela fazia comidas gostosas, rolinho primavera, sorvete, sushi. Ela dirigia rápido seu passat verde-abacate. Ela dava a maior importância ao embrulho dos presentes que ganhava; nunca rasgava o papel, abrindo-o com uma delicadeza que me fascinava. Ela me ensinou o amor à vida, a valorização do belo, o respeito às origens. Mas não por palavras; pelas atitudes e ações.

E o oditian, japonês de poucas palavras. Ele e seu quartinho mágico, que ficava nos fundos, onde havia pipetas, balança de pratos, cheiro de fermentação. Era o adubo orgânico que ele produzia e comercializava... E no escritório dele havia máquina de escrever, papel carbono, carimbos, grampeador. Eu passava horas brincando ali. Na brincadeira, eu era caixa de banco e secretária.

No chão, a Kame-san, ou "Dona tartaruga". Senhora de meia-idade e andar decidido. Anos depois, ela foi morar em casa e, numa de suas desventuras, mordeu o dedão da minha amiga Alessandra. Quando mudamos da casa para um apartamento, Kame-san não tinha para onde ir... Acabou sendo levada para respirar ares mais puros no litoral norte, mais precisamente em Ilhabela.
Onde andará a essas alturas a Dona Tartaruga?

Um comentário:

  1. Rita,
    fazia tempo que não visitava o seu blog... Que delícia que ele está. Gostei particularmente desse texto e dessa foto, com descrições tão bonitas e singulares sobre sua família.
    Beijo,

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